FAROESTE CABOCLO
Adaptação de canção oitentista para as telas do cinema resulta em autêntico filme de ação, drama e romance
Composta
em 1979 por Renato Russo, mas lançada oficialmente apenas em 1987, Faroeste
Caboclo é com certeza uma das músicas mais bem elaboradas do rock nacional,
além de ser uma das mais longas com cerca de 10 minutos. A envolvente história
de João de Santo Cristo com suas aventuras e desventuras no sertão e depois na
cidade grande e seu amor por Maria Lucia, a moça da cidade, embalou gerações ao
longo de 26 anos e as notícias de que seria adaptada para o cinema finalmente se confirmaram como pôde ser comprovado em maio deste ano.
Como acontece em quase todas as adaptações feitas para o cinema, a música de Renato Russo sofreu consideráveis modificações para tornar-se uma história completa em todos os aspectos para tornar-se crível aos olhos do público em geral, sejam estes fãs da música ou não. O filme dirigido por René Sampaio é ambientado na década de 1970, período da ditadura militar e época um tanto distante da realidade atual, exceto por questões sociais que sempre ressoam atuais em nossa sociedade contemporânea como o racismo, por exemplo, argumento que permeia o roteiro da obra em seu personagem principal, João de Santo Cristo que além de negro, é pobre e tem pouco estudo, embora tenha muita inteligência e uma peculiar esperteza, essenciais para a sobrevivência no violento submundo de violência e tráfico de drogas no qual ele cresce e vive. E particularmente a cena de estupro que João sofre tanto na música quanto na metade da narrativa, é o estopim para sua explosão de fúria que se desenvolve no decorrer da trama.
O roteiro escrito por Victor Atherino e Marcos Berstein toma algumas liberdades poéticas em relação à letra da música, de modo que os atos de João de Santo Cristo são sempre justificáveis e ao contrário do que diz a canção, no filme ele nunca "rouba dinheiro da igreja" e nem é "o terror da sertania onde mora", ou seja, João é anti-herói mas não é mau caráter, pois entra em confronto com pessoas verdadeiramente más como o seu rival, o traficante Jeremias e o policial corrupto Marco Aurélio, ótimo vilão interpretado por Antonio Calloni, que não existe na letra da música.
René Sampaio demonstra notável talento na direção de atores, todos talentosos por sinal, Fabrício Boliveira traz a energia e o carisma necessários para compor o João de Santo Cristo tanto quanto Ísis Valverde tem o charme e a sensibilidade de Maria Lucia, e a química do casal dá o tom adequado para o romance que remete fielmente à letra da canção. Felipe Abib por sua vez, compõe Jeremias como um autêntico cafajeste além de ser um dos "playboyzinhos da cidade" como diz a música.
Além da ação de ótima qualidade o ponto alto da película obviamente é o esperado duelo final que faz jus ao título Faroeste Caboclo, pois Sampaio filma o confronto dos antagonistas como num autêntico western e não há como negar sua homenagem ao mestre Sergio Leone pelo modo como retrata os atores com closes extremos em seus rostos ou o enquadramento mostrando ambos encarando-se como num ritual em campo aberto aberto prestes a sacarem suas armas para o destino final de suas vidas. Entretanto, mais uma vez com a liberdade poética do roteiro, não há público para ver o confronto ao contrário do que diz a música, apenas Maria Lucia que tal como na canção intervém no destino de ambos.
Mesmo com um retrato um pouco diferente e por vezes suave em relação à letra original, o filme mantém o espírito da canção embora visualmente seja mais uma estória policial do que propriamente um faroeste - entretanto a jornada de João de Santo de Cristo, do sertão à cidade grande é o itinerário certo para a bela estória escrita e interpretada por Renato Russo. Só é difícil saber se o filme seria agradável ao artista tanto quanto os 168 versos de sua inesquecível música.
TRAILER
Faroeste Cabloco (2013)
Direção: René Sampaio
Roteiro: Victor Atherino e Marcos Berstein
Elenco: Fabrício Boliveira, Ísis Valverde, Felipe Abib, Antonio Calloni, César Trancoso, Alex Sander, Marcos Paulo, Cinara Leal, Rodrigo Pandolfo
Nenhum comentário:
Postar um comentário