DESEJO DE MATAR
Há 40 anos, Charles Bronson iniciava uma caçada solitária nas ruas mais escuras de Nova Iorque
Em 1974 estreava nas telas estadunidenses e
logo em seguida em todo o mundo Desejo de
matar (Death Wish), filme dirigido pelo inglês Michael Winner, e que alçou
Charles Bronson ao estrelato na América do norte e marcou para sempre o gênero
policial, bem como o cinema físico como um todo. Bronson vinha de uma carreira bem sucedida na
Europa, onde era aclamado como astro, admirado pelo público e pela
critica, tendo atuado nas produções francesas O Passageiro da chuva (Le Passager de la Pluie, 1970), Cold
Sweat (1970), ou em produções italianas como Cittá
Violenta (1970), e o mítico faroeste Era Uma
vez no Oeste (Cera Uma volta i´l West, 1968).
Desejo de matar
surgia num momento em que a cidade de Nova Iorque enfrentava uma forte onda de
violência com suas ruas e becos aterrorizados por gangues, ladrões e até
estupradores e desde então e por muito tempo chegou a ser considerada a metrópole mais violenta do mundo – nesse contexto brutal, o filme acendia uma polêmica que
decisivamente impulsionaria o sucesso de bilheteria, a aclamação do público e o ódio da critica
especializada: a justiça com as próprias mãos. A idéia de que um cidadão comum
pudesse armar-se de uma pistola e executar criminosos à noite era algo
inspirador e ao mesmo tempo muito perigoso, pois não cabe ao cidadão (de
nenhuma sociedade) as funções de júri, juiz e carrasco.
Michael Winner orientando Bronson |
Hope Lange |
Kathleen Tolan |
Jeff Goldblum a esquerda |
A adaptação para as telas
O livro apesar de não ter grande sucesso nas vendas, chamou a atenção de dois produtores de cinema, Hal Landers e Bobby Roberts, que em 1972, mesmo ano de lançamento do livro, compraram os direitos para uma possível adaptação às telas do cinema, e a obra encontrou um caminho certeiro nas mãos do cineasta Michael Winner, do lendário produtor Dino De Laurentis e dos estúdios United Artists, únicos a se interessarem pelo projeto.Consta que também foi um grande problema encontrar o ator certo para o papel que foi recusado por atores bem mais cotados na época como Steve McQueen, Clint Eastwood e até o cantor Frank Sinatra - e também Henry Fonda que chegou a considerar o papel como "repulsivo". Felizmente, Bronson aceitou o papel após ler o roteiro que Winner lhe ofereceu não à toa, pois o ator já havia trabalhado com o diretor anteriormente em 3 ótimos filmes, Renegado Impiedoso (Chato´s Land, 1972), Assassino a preço fixo (The Mechanic, 1972) e Jogo Sujo (The Stone Killer, 1973). Portanto, Death Wish concretizou a continuidade da ótima parceria entre o diretor e o ator.
Kersey ganha de presente de um amigo uma pistola Colt Positive. 32, durante uma viagem ao Arizona |
Bronson, à época com 52 anos de idade foi a escolha mais do que certa para o papel e ao contrário dos atores citados no parágrafo àcima ainda não era um astro para o público de seu país, sendo apenas um ator popularmente conhecido pelos bons filmes que fizera recentemente em Hollywood, além dos filmes europeus que não atraíam muito a atenção das platéias norte-americanas. Era chegada então a hora de Charles Bronson brilhar intensamente nas telas de seus país.
A repercussão
A adaptação para as telas foi um grande sucesso de público com renda de mais US $ 22 milhões nas bilheterias para um orçamento de apenas US $ 3 milhões, segundo consta no IMDB. Contudo, o filme provocou bastante polêmica devido ao delicado tema e muitos críticos de cinema atacaram duramente a obra, inclusive rendeu críticas negativas do jornal The New York Times, mas também rendeu respostas inteligentes como a do carismático ator Vincent Gardenia: "Eu não aprovo o vigilantismo, mas também não aprovo que os marginais levem a melhor".No filme, Gardenia interpreta Frank Ochoa, o detetive que persegue Kersey para tentar desencorajá-lo. Afinal, o trabalho do vigilante estimulou vários outros cidadãos comuns a se defenderem de modo que o crime reduziu cerca de 50% nas ruas da cidade, conforme revelava as estatística da imprensa e assim o vigilantismo ganhava cada vez mais força preocupando a polícia e também o prefeito de Nova Iorque.
No filme, o Inspetor Ochoa investiga os passos do vigilante e o persegue para atender ao pedido que o prefeito lhe fêz pessoalmente: "assuste ele" |
Convém lembrar que este clássico pertence à agitada década de 1970, período de grandes discussões e profundas transformações sociais, algo que refletiu, e muito nas telas do cinema. Desejo de matar nasceu polêmico e como tal, provocou debates e discussões como tantas outras obras setentistas, como o clássico absoluto do horror O Exorcista (1973), por sinal estreado no anterior, ou o complexo Laranja Mecânica (A Clockwork Orange, 1971), até hoje muito discutido, só para citar dois grandes exemplos de obras polêmicas.
O sucesso de Desejo de matar gerou uma febre de vários filmes de justiceiros, o que não deixa de ser admirável embora o tema "justiça com as próprias mãos" nem fosse algo totalmente novo, já tendo sido abordado nas décadas anteriores em westerns e alguns thrillers. O que explica o enorme sucesso de Death Wish é o fato de o público ter se identificado rapidamente com o personagem Paul Kersey, um cidadão até então pacifista que após ter a família vitimada pela violência urbana resolve agir por conta própria a fim de tentar reduzir a criminalidade em sua cidade.
Entretanto, é bom notar que o filme não retrata Paul Kersey como um herói, mas sim um anti-herói que aos poucos se torna tão frio e violento quanto os marginais que ele caça. Mas infelizmente grande parte do público o viu como uma espécie de herói revolucionário, um sujeito acima da lei com motivos o suficiente para sair matando todos os criminosos que encontra pela noite. E este pensamento do público se estende até os dias atuais, pois em 2007 aqui no Brasil a platéia aclamou o Capitão Nascimento do filme Tropa de Elite como um grande herói e não como o personagem complexo que Wagner Moura interpretou tão bem.
Dentre várias cenas memoráveis destaca-se uma cena filmada nas escadarias de um parque, quando Kersey ao descer os degraus é abordado por 3 ladrões, um no alto da escada e mais dois no final dos degraus, e então travam um tiroteio e logo em seguida uma perseguição que leva aos momentos finais do longa. Numa das primeiras caçadas Kersey salva um sujeito desconhecido em um beco, matando 3 assaltantes. Um dos bandidos é interpretado por um desconhecido Denzel Washington com apenas 19 anos de idade e em pleno início de carreira.
Como ocorre com muitos filmes de sucesso, Desejo de Matar inevitavelmente virou franquia ganhando uma sequencia mediana no ano de 1982, e anos depois mais três sequencias desnecessárias e até desprezíveis que infelizmente chegam a ofuscar o brilho do primeiro filme que deveria ser único, e o personagem que Bronson compôs tão bem originalmente, transformara-se num mero e descartável anti-herói de ação.
Death Wish nunca foi refilmado, exceto se considerarmos que um certo thriller policial intitulado Valente (The Brave One, 2007), estrelado pela atriz Jodie Foster e dirigido por Neil Jordan trata-se de uma refilmagem disfarçada, trocando Paul Kersey por uma mulher chamada Erica Brain, e que resolve caçar criminosos à noite, também na cidade de Nova Iorque, após perder o noivo de forma violenta, inclusive com direito a uma cena que se passa no vagão do metrô, muito parecida com a cena do filme de Michael Winner.
Em 2008, quando estreou nos cinemas Rambo IV, Stallone chegou a dizer em entrevistas que tinha interesse em refilmar Death Wish, ambientado nos dias atuais. Felizmente o interesse de Sly ficou só na promessa, pois refilmar uma obra tão enraizada na década de 70 seria algo muito arriscado - afinal, atualmente Nova Iorque já não é uma das cidades mais violentas do mundo e ambientar tal história em outro lugar poderia não surtir o mesmo efeito. E para todos os efeitos, desde que Paul Kersey resolveu fazer caçadas noturnas 40 anos atrás, os becos e ruas escuras jamais foram os mesmos. (R.A.)
TRAILER
Desejo de matar - Death Wish, 1974
Roteiro: Wendell Mayes
Direção: Michael Winner
Elenco: Charles Bronson, Hope Lange, Kathleen Tolan, Steven Keats, Vincent Gardenia
Lembro bem a primeira vez que vi esse filme no Corujão à uns anos atrás pela primeira vez, eu tenho só 25 anos, então nem cheguei a viver os anos 80 ou muito menos os anos 70 pra entender a temática do filme de uma forma que eu me identificasse, conheci Charles Bronson através de Era uma vez no Oeste e pelo que meu pai falava, "ele explodia marginais com uma escopeta". Já olhei todos os "Desejo de matar", mas o que constrói bem o personagem ou o desconstrói, já que é um anti-herói é esse primeiro filme. Apesar de curto e com bastante pontas soltas, o arco de transformação do personagem ao longo do filme é extremamente bem feito. Filme recomendadíssimo.
ResponderExcluirÉ isso aí Cristian, se vc apreciou Desejo matar numa sessão do corujão, pode se considerar privilegiado, rsrs. E que bom que vc descobriu ou está descobrindo quem foi o ator Charles Bronson, e já que vc viu Era uma vez no Oeste, então vc teve mais privilégio ainda para um fã de cinema tão jovem. Bronson foi muito mais que um sujeito durão e é uma pena que muitos não saibam disso. Recomendo que vc assista outros filmes dele que citei neste dossiê e outros que resenhei aqui no blog.
ExcluirGrande Abraço!!